Portal da Sustentabilidade

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Guy Ladvocat & Isabel Sbragia

A questão ambiental vem se destacando como um assunto de importância crucial em todas as esferas de discussão. Fala-se não apenas em preservação do meio ambiente e dos recursos naturais renováveis mas também para evoluirmos a uma sociedade ambientalmente correta e construirmos cidades mais resilientes. Escolas implantam atividades de educação ambiental para as crianças, fóruns internacionais discutem o mercado de créditos de carbono, governos criam legislações mais rigorosas e penalizam empresas poluidoras, prefeituras implantam a coleta seletiva de lixo, temos a nova política de mudanças climáticas, foi criada a política de resíduos sólidos, proliferam “selos verdes” para produtos, meios de hospedagem adotam políticas de turismo sustentável. Mais recentemente, a questão das emissões dos gases de efeito estufa ganhou destaque em função do problema das mudanças climáticas. O aumento da concentração destes gases na atmosfera, em consequência das atividades geradas pelo homem, foi intensificado com a Revolução Industrial no século XIX. Contribuíram significativamente para isto a queima de combustíveis fósseis, a agricultura e pecuária, o desmatamento, entre outros. Atualmente, aguardamos as novas propostas em relação ao tema e novos acordos mais eficientes nessa questão.

Os efeitos globais da poluição têm contribuído para a sensibilização da sociedade sobre a questão ambiental, com crescente destaque na mídia e na agenda de políticos e ambientalistas no mundo. Em uma pesquisa realizada em 2010, para identificar se a implementação de Sistemas de Gestão Ambiental promove a efetiva melhoria do desempenho ambiental de empresas brasileiras, e se estes sistemas permitem uma relação custo-benefício favorável a estas organizações, foi demonstrado que, embora ainda existam diversos pontos com potencial de melhoria nos sistemas pesquisados, as organizações estão conseguindo melhorar seu desempenho ambiental ao longo do tempo e também auferir benefícios econômicos com a operação destes sistemas. Algumas das ações tomadas pelas empresas já demonstram alinhamento com a tendência atual de busca da sustentabilidade (CINTRA, 2011).

Por outro lado, há que se considerar que a implantação de um sistema de gestão ambiental eficaz pode demandar investimentos incompatíveis com o negócio. Cria-se então um paradoxo entre proteger o meio ambiente e a capacidade das empresas em manterem sua atividade num nível de lucratividade que permita sua sobrevivência e a manutenção de seu papel social de geração de renda, empregos, divisas e fortalecimento da economia do país (CINTRA, 2011). Devem ser respeitadas as respectivas capacidades das empresas em atuar perante a gestão ambiental e existir auxílios para aquelas que não possam atuar de maneira satisfatória em relação aos seus impactos ambientais.

Até recentemente, acreditava-se que a inteligência e a tecnologia poderiam resolver qualquer problema e que não havia limites para o desenvolvimento da espécie humana e para a utilização de matéria e energia, na busca de conforto e qualidade de vida (BRAGA et al., 2005). Hoje já se sabe que isto não é verdade. Além disso, é uma dicotomia o fato de que a solução para o problema talvez seja o desenvolvimento tecnológico que, por si só, pode ser um fator de aumento do consumo de recursos naturais e de geração de resíduos. Devemos nos esforçar para que esse desenvolvimento tecnológico seja alinhado ao desenvolvimento sustentável. Se a humanidade continuar no nível de consumismo dos dias atuais, muito cedo os recursos naturais do planeta se esgotarão e o desenvolvimento da tecnologia não avançou na proporção que deveria para a resolução dos problemas atuais.

 

É importante ressaltar que, da mesma forma que nos programas de qualidade se busca a melhoria contínua, a sustentabilidade não é uma meta fixa a ser atingida. Mais do que uma simples mudança é um processo contínuo de transformação na forma de encarar a vida. O real engajamento de todos da organização, principalmente da alta direção é condição primordial para que todos os colaboradores saibam a importância do processo para o sucesso da empresa e seu papel nesta engrenagem. Todos devem saber os reais motivos de se buscar a sustentabilidade e quais os benefícios, para a empresa, para os colaboradores e para a sociedade.

Diversas iniciativas já existem na tentativa de se incentivar um processo de produção e consumo sustentáveis. Requisitos de sustentabilidade são considerados nas exigências para os fornecedores de produtos e serviços nas compras públicas, em diversos países. Mesmo no Brasil, esta questão já está sendo bastante discutida e algumas ações já vêm sendo tomadas. Neste aspecto, o papel do governo é fundamental. Apesar dessas iniciativas, ainda se percebe que há muito mais a se fazer, falta eficiência no gerenciamento, na fiscalização e na área de serviços, tais como no tratamento de água, esgoto e gerenciamento de resíduos domésticos, permanece um contínuo desperdício dos recursos naturais (ROSE, 2007).

O mercado tem exercido influência na adoção de práticas ambientais por parte das organizações. Os processos de abertura comercial têm intensificado a competição entre países e entre empresas. As organizações que oferecem produtos/serviços ecologicamente corretos crescem na preferência do mercado mundial, onde um novo consumidor passa a diferenciar produtos e serviços pelo desempenho ambiental de quem os oferta (SCHLINDWEIN et al., 2009).

Portanto, as ações das empresas neste sentido normalmente não são espontâneas, são o resultado da influência de três grandes forças que interagem simultaneamente: o governo, a sociedade e o mercado. Nas últimas décadas, as empresas deixaram de ser vistas apenas como instituições com responsabilidade para resolver os problemas meramente econômicos e passaram a se voltar também para questões de caráter social, político e ambiental, tais como: controle da poluição, segurança do trabalho, qualidade de produtos, assistência social, defesa de grupos minoritários. (SCHLINDWEIN et al., 2009).

Entretanto, a disparidade existente entre as regiões mais ricas e as regiões mais pobres do planeta dificulta muito atingir o equilíbrio necessário entre produção e consumo de forma a tornarmos o planeta sustentável. Muitas empresas tomam ações importantes no campo social e no campo ambiental, buscam desenvolver produtos com materiais reciclados, controlam suas emissões, efluentes e resíduos, implantam programas sociais, entre outros. No entanto, muitas vezes, estas ações não são integradas e não incluem a dimensão econômica, o terceiro pilar da sustentabilidade.

Infelizmente, sofremos hoje com a banalização do termo sustentabilidade. Programas ambientais se apropriam do termo e se auto intitulam sustentáveis. Entretanto, muitos destes programas são os chamados Greenwashing, ou lavagem verde, onde a utilização de dados das empresas induz a interpretação errada em relação à questão ambiental, manipulando as informações que chegam ao público.

Em razão do processo complexo de implantação da consciência da produção e consumo sustentáveis, cresce a convicção de que o problema não poderá ser resolvido com medidas somente políticas e técnicas. Elas, embora necessárias, são paliativas. A solução demanda uma coalizão de forças mundiais ao redor de uma nova sensibilidade ética, novos valores, outras formas de relacionamento com a natureza e novos padrões de produção e consumo (BOFF, 2006).

Em 2014, após apresentar PIB negativo em dois trimestres consecutivos, o Brasil entrou na chamada recessão técnica da economia. Segundo dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), a principal causa foi a diminuição dos investimentos. A pesquisa “Indicadores Industriais da Confederação Nacional da Indústria (CNI)” demostrou que o faturamento real da indústria brasileira caiu em 2014 e que, com a dificuldade para intensificar o ritmo de operação, a indústria continuou demitindo. Isto provocou um cenário desfavorável para a Gestão Ambiental. Infelizmente, as questões ambientais em geral ainda são vistas pelas empresas como algo a mais a ser feito, com aumento dos custos, e não como algo a ser incorporado no seu processo de sustentabilidade. Essas questões deveriam ser encaradas como oportunidades de crescimento ou como fonte de informações relevantes aos processos produtivos que podem ser usados para uma gestão mais eficiente dos recursos.

Temos que, de alguma forma, evitar esse retrocesso, ainda mais no cenário atual, onde a crise ambiental e econômica é o foco principal. Para fazer frente às necessidades desta fase crítica, a criação de mecanismos indutores dessa nova prática se faz necessária. Sempre que a economia entra em recessão, esta é uma das primeiras áreas a sofrerem cortes. Isto não deveria acontecer, afinal, a sustentabilidade está engajada na manutenção de cenários favoráveis à produção e à economia, com a prevenção de desastres e escassez de insumos.

Se nada for feito, enquanto esperamos melhores condições econômicas, corremos o risco de, ao invés de se realizarmos investimentos para resguardar um futuro sustentável para a nossa sociedade, como também para as próprias empresas, teremos que arcar com os custos muito elevados para restabelecer o meio ambiente e com os prejuízos econômicos decorrentes deste processo.

Para informação sobre a bibliografia, entre em contato com os autores pelos e-mails guy.ladvocat@abnt.org.brouisabel.sbragia@abnt.org.br.

Artigo publicado originalmente no livro BenchMais3 em Julho/2015